Canção do Outono Sombrio


(Celebratory Whim Ford Smith)
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CANÇÃO DO OUTONO SOMBRIO
(André L. Soares)
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Tenho pisado em folhas secas
Que se amontoam aos pés das cercas
Depois esvoaçam pelo chão.
Acima, quase brilha um sol cinzento
Simultaneamente ao vento
Que uiva a mais sombria das canções.
Vivo uma tristeza há mais de trezentos dias
Sem ver flor ou ler poesia
Numa busca que parece ser em vão.

Nos meus olhos respinga a garoa fina
Que se funde às minhas lágrimas...
– nem sei se sou eu quem chora ou se é o céu –.
Escondido sob o espesso sobretudo
Carrego o peso do mundo em minhas costas
Seguindo só com minhas botas e o destino infiel.
No meu caminho, a primavera não é óbvia
Pois sinto mais frio que num inverno em Varsóvia
– sonhos congelados na nevasca da ilusão –.

Aspiro o pó branco que sobe pelas narinas
Ou mergulho na bebida ofertada nos bares...
– falsas amigas que me empurram para a cova –.
Não mais havendo lua-nova em minhas noites
Semi-serro as pálpebras e me acostumo ao breu
Afinal, o pior inimigo a enfrentar ainda sou eu.

Feito um corsário sem rumo
Minha alma de pássaro ganhou o azul
Migrou pro Sul... foi embora no outono.
E se me mantenho em pé é por paixão
Tenho fé, que apesar de tanta derrota
Ao abrir alguma porta, ainda haverá verão.
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André L. Soares – Canção do Outono Sombrio.